Anestesista teme cenas de guerra com falta de sedativos para pacientes intubados
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DIEGO VARA - Escassez de sedativos em todo o país tem levado médicos a recorrerem a medicamentos em desuso e combinações de remédios, para garantir que pacientes permaneçam inconscientes enquanto intubados
Os estoques de sedativos e bloqueadores musculares estão se esgotando em todos os Estados do Brasil, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). "Você não vai sentir dor". Esta era a promessa que o anestesista Leonardo Camargo costumava fazer quando sedava pacientes para a intubação - a única promessa possível diante dos casos mais graves de covid-19.
Hoje, ele já não sabe se pode recorrer a essas palavras de conforto.
Os estoques de sedativos e bloqueadores musculares estão se esgotando em todos os Estados do Brasil, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). No hospital Tacchini, em Bento Gonçalves (RS), onde Camargo trabalha, os médicos já recorrem a medicamentos em desuso para manter os pacientes intubados e preveem o uso de antipsicóticos com efeito adverso de sonolência como alternativa em caso de escassez total de sedativos.
"A gente está associando sedação com medicamentos que usualmente não se usa em terapia intensiva para manter paciente em ventilação mecânica, como Metadona (opioide) e o próprio Bialzepam (ansiolítico) em comprimido", disse Carmargo à BBC News Brasil.
"São medicamentos que já estavam em desuso e a gente está associando para poder usar e baixar as doses dos outros remédios em falta. Sou anestesista há 15 anos e usei tiopental (barbitúrico usado para indução de anestesia geral) duas vezes lá na época da minha residência. A gente está começando a usar tiopental agora para os pacientes, porque os medicamentos mais modernos estão acabando."
Essa semana, porém, a equipe do hospital passou a discutir alternativas mais dramáticas diante de um cenário de falta total de sedativos e bloqueadores musculares usados para intubação.Camargo conta que está levantando o estoque de antialérgicos e antipsicóticos, por serem remédios que provocam sonolência e leve sedação como efeitos colaterais. Eles seriam usados numa eventual tentativa desesperada de manter os pacientes inconscientes enquanto permanecem intubados.
"Enquanto tiver remédio para alergia, que dá um pouco de sedação, ou remédios antipsicóticos, como Haloperidal, vamos usar para tentar manter os pacientes intubados", disse o anestesista.
Caso o pior cenário se confirme e a escassez de sedativos não seja resolvida no curto prazo, as cenas que o médico descreve se assemelham a imagens dramáticas vistas em guerras: pacientes com dor se debatendo por falta de anestesia, tratamentos improvisados, prateleiras vazias e mais mortes.
"A gente ouve falar que em alguns locais tiveram que amarrar pacientes. Eu não sei se vamos chegar a isso", diz.
"A gente já está verificando o que tem de estoque. Está tentando criar essa contingência e se preparando para o pior."
Outra medida adotada pelo hospital onde Camargo trabalha foi interromper todas as cirurgias eletivas, já que analgésicos e sedativos que tradicionalmente eram usados só nos centros cirúrgicos passaram a ser utilizados, também, para manter os pacientes graves com covid-19 intubados.(Época)
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